Um blogue pessoal mas... transmissível

30
Jul 09

 

 

Há dias pude ler no Público a opinião de um leitor devidamente identificado que dizia sentir-se incomodado com o "destaque excessivo" que o referido diário tem conferido nos últimos tempos aos temas relacionados com a homossexualidade. Não sou fundamentalista e detesto todos os tipos de fundamentalismos. Por conseguinte, não me vou colocar aqui na posição de muitas pessoas que por serem objecto de uma opinião contrária parece quererem instaurar imediatamente a censura na boa tradição das ditaduras de todos os quadrantes políticos. Aliás, estamos num país livre e democrático (até ver…) e todas as opiniões são bem-vindas, desde que devidamente fundamentadas e não fruto de uma visão distorcida da realidade envolvente. Porque, como diz o nosso povo, "o pior cego é aquele que não quer ver".

 

Pois bem, o que me leva a escrever este post/pensamento é o facto de o referido leitor considerar verdadeiramente "inusitada" a visibilidade que hoje em dia é dada aos homossexuais e aos temas que abordam essa realidade. Pode-se perguntar então porque motivo é que o mesmo leitor não se queixa do destaque excessivo que é dado à heterossexualidade em todos os órgãos de informação. Parece-me que o referido jornal, ao abordar essa temática, mais não faz do que acompanhar a evolução social e cultural dos tempos, tendo como único objectivo fazer bom jornalismo e por isso mesmo não discriminando ou abafando uma realidade que pelos vistos não agrada a muitos leitores, mas à qual é preciso conferir cada vez maior visibilidade, sobretudo se tal visibilidade for aproveitada para que os homossexuais possam ver reconhecidos os mais elementares direitos de cidadania.

 

Refere-se o leitor à recente reportagem sobre a homossexualidade no Estado Novo, afirmando nomeadamente que o Público insiste de forma "desconchavada" em tais matérias. Torna-se por demais evidente que o leitor, e como ele muitos outros neste país de brandos costumes, não conseguiu ler criteriosamente essa e outras reportagens e artigos, pois se o tivesse feito, livre de preconceitos e afins, dar-se-ia conta que revelam, na minha opinião de simples leitor, uma apurada investigação jornalística. Também não parecem ser obra de um qualquer lobby gay como muitas pessoas obstinadamente acusam todos aqueles que tratam essas matérias livres de ideias e opiniões preconcebidas. Neste sentido, pergunto-me se um tal artigo de opinião corresponde àquilo a que habitualmente chamamos "direito de opinião" ou se, pelo contrário, é revelador daquela homofobia larvar de que ainda enferma grande parte da sociedade portuguesa.

 

Outra coisa interessante é a comparação que o leitor faz entre o diário português e o jornal espanhol El País. A meu ver, a comparação é perfeitamente desajustada. Isto porque os dois jornais se inscrevem em realidades sociais bem distintas. Por um lado, a realidade nacional em que a conquista plena dos direitos de cidadania pelos homossexuais ainda está por fazer, e se assim é nunca será excessivo o destaque que é conferido a essa temática. Por outro lado, o contexto do país vizinho em que essa consagração já foi alcançada, sendo por isso perfeitamente compreensível que já não faça tanto sentido falar dos assuntos que tanto incomodam o referido leitor. Aliás, a este respeito não é só na Península Ibérica que as coisas andam a duas velocidades. Por contraste, ainda recentemente a Suécia tornou-se no 7.º país a legalizar os casamentos homossexuais enquanto que, do outro lado do mar Báltico, a Lituânia aprovou legislação no sentido de proibir a divulgação da homossexualidade...

 

E não será pelo facto de estarmos a viver a chamada silly season que tudo parece valer, como diz o indignado leitor no seu artigo. Nunca será demais pugnar pela defesa dos direitos de cidadania que há demasiado tempo são negados a um grupo de pessoas pelo simples facto de possuírem uma orientação sexual diferente da maioria da população. Whatta fuck!? Afinal em que medida é que a minha orientação sexual pode afectar a vida do pacato leitor e de tantos outros por esse país fora? O que o deveria afectar em consciência é a forma como os homossexuais ainda são tratados na sociedade portuguesa. Isso sim deveria constituir um grave problema na consciência de muitas pessoas, especialmente na consciência de todos aqueles que com as suas posições públicas mais não fazem do que alimentar o preconceito homofóbico e acrescentar sofrimento a muitos homossexuais. Mas para todos aqueles que se preocupam realmente com que a democracia seja uma realidade neste país será de louvar que jornais como o Público tratem com o destaque merecido a homossexualidade e outros temas que saem dos padrões da dita "normalidade" para que, um dia destes e de uma vez por todas, esses temas deixem de merecer o "destaque excessivo" de que se queixa o referido leitor.

 


28
Jul 09

 

 

Neste fim-de-semana, eu e o R. decidimos fazer uma incursão na noite gay da Cidade Invicta. Confesso que há muito tempo que não frequentava a "cena gay" porque de cada vez que o fazia sentia que estava a desperdiçar o meu tempo e que aquele ambiente estereotipado pouco tinha a ver comigo.

 

Além disso, não sou grande apologista de locais que se podem confundir facilmente com guetos para onde se procuram atirar as pessoas indesejadas com o intuito de as ocultar da vista do comum dos mortais. É por estas e outras que a homossexualidade passa quase despercebida à grande maioria das pessoas. Sabem que existe mas encaram os homossexuais como alienígenas que se encontram regularmente em locais muito estranhos e obscuros. E por isso a homofobia continua a campear, especialmente nos pequenos meios, onde os homossexuais ainda têm mais propensão a "esconder-se" em locais como esses. Para mim, a homossexualidade tem de vir cada vez mais para a luz do dia e os homossexuais têm de "misturar-se" com todas as outras pessoas. Mas isto daria assunto para outro post/pensamento.

 

O que é certo é que o R. propôs-me uma noite de sábado diferente e desta vez eu acedi. De tudo o que pude observar nos locais por onde passámos - primeiro um bar gay friendly e seguidamente uma disco gay - é que realmente pouca coisa muda com o passar dos anos. À primeira vista, o ambiente até pode ser descontraído e agradável, mas rapidamente apercebemo-nos que a imensa maioria dos gays está ali com um propósito bem definido: engatar. Não interessa quem. O que interessa é engatar alguém para aquela noite ou para o que resta dela. É um autêntico "mercado de carne"... Acresce que muitas destas pessoas têm uma propensão doentia para opinar sobre a vida dos amigos, conhecidos, ex-namorados. Comenta-se sobre quem anda com quem, sobre o facto de A. e B. terem rompido, que C. anda à procura de nova relação, que D. veste mal, que E. engordou...

 

Posso estar a ser exagerado e a tomar a parte pelo todo, mas causa-me imensa confusão ver toda aquela gente com o único propósito de engatar alguém para uma noite de sexo. Acho que cada um deve ser livre de fazer o que quiser com a sua vida desde que isso não afecte a vida de terceiros. No entanto, questiono-me sempre sobre a razão de ser de um comportamento tão promíscuo. Será que ninguém tem expectativas mais elevadas em relação à sua vida sentimental? Parece que nestes meios tudo gira em torno do sexo e que para além dele nada mais existe. Eu gosto muito de sexo mas no estádio actual da minha existência já não me contento com sexo puro e duro. Para mim, actualmente, sexo sem amor não faz qualquer sentido. Porque sexo sem amor é um acto puramente mecânico sem aquele misto de sentimentos que só o sexo entre duas pessoas que se amam pode oferecer.

 

Depois ninguém se lembra que, por alguma razão, o sexo pode acabar de um dia para o outro, e nesse caso não fica mais nada. Não existe amor, carinho, companheirismo. Fica apenas solidão, carência, vazio. E frequentemente isso é a porta aberta para o suicídio. Por outro lado, também os gays envelhecem e quantas vezes, no meio da solidão e do desespero, procuram construir aquilo que na juventude e meia-idade não quiseram ou não foram capazes de construir. Parece que ninguém ou quase ninguém quer investir numa relação estável e duradoura que possa oferecer segurança e bem-estar na velhice.

 

E para não me alongar mais neste pensamento, diria que depois desta noite a minha opinião sobre estes locais em nada mudou. Apesar de estar acompanhado pelo meu namorado, fui insistentemente penetrado pelos olhares de quem ali se encontrava e por duas vezes até fui apalpado. Então quando o R. foi apalpado quase me passei! Por isso, resolvemos sair dali e procurar um local menos "obscuro" para acabar a noite...

 


26
Mar 09

 

Hoje, quando já nada o fazia prever, volto a entregar-me a este imenso prazer que é blogar. Os factos a isso obrigam. É que quando ia a sair da escola e me dirijo ao carro, qual não é o meu espanto ao ver uma multa por estacionamento indevido, ostensivamente escarrapachada no pára-brisas. Com efeito, quando regressei à escola depois do almoço, constatei que todos os lugares no estacionamento situado em frente já estavam ocupados. Decidi então colocar o carro num local mais afastado e interdito a estacionamento, como já tinha feito algumas vezes, confiando que a polícia não iria passar por aquelas bandas, uma vez que é um lugar bastante discreto. Puro engano. A comprovar isso mesmo, está a multa que não me deixa mentir e que vou ter mesmo de pagar…

 

Mas avancemos. Entro no carro e apercebo-me que não trago comigo os óculos de sol. Volto a sair do carro, furioso comigo mesmo por todas as razões deste mundo, e regresso à escola com o intuito de apanhar os óculos que deixei (mais uma vez) na sala de professores. Mal franqueei o portão de entrada, dou de caras com dois colegas que conversavam animadamente sobre o assunto que por estes dias é obrigatório em todas as conversas de ocasião: o facto de o conselho executivo estar a ponderar a aplicação de sanções aos professores que não entregaram, no seu devido tempo, os objectivos individuais, entre os quais eu me incluo. Escusado será dizer que os colegas me desafiaram a entrar na conversa, embora eu estivesse com pressa e não quisesse contribuir mais uma vez para esse estafado assunto. Mas, enfim, lá acedi a participar.

 

Apesar de ser um pouco "espalha-brasas" quando a "mostarda me sobe ao nariz", nunca assumi a postura de enfant terrible. Mas desta vez, porque se requeria uma actuação dura e em conformidade com a gravidade da situação, decidi não entregar os objectivos individuais e acarretar com as eventuais consequências. Em circunstâncias normais, não o faria, mas tive mesmo de o fazer no respeito pela minha própria consciência e em oposição a um modelo de avaliação tão desfasado da nossa realidade escolar. Ora, a conversa azedou, isto porque confrontei os ditos colegas com a sua falta de coerência. Em tempos não muito recuados, foram os primeiros a manifestar a sua indignação e discordância perante o modelo que o ME implementou na avaliação dos docentes e poucos meses depois dão o dito pelo não dito e entregam os objectivos individuais, passando a engrossar o rebanho de "miluzinhas" e "socretinhos" que infesta o país.

 

Há pouco tempo, discorri num blogue amigo sobre os efeitos da frontalidade nas relações de trabalho e de amizade. Nunca gostei de meias-tintas. É preferível pôr imediatamente as cartas em cima da mesa do que alimentar eternamente uma situação dúbia. Se os meus interlocutores tiverem a humildade para aceitar uma crítica ou uma opinião menos favorável é muito bom sinal. De contrário, as relações de trabalho (ou de amizade) mover-se-ão constantemente num terreno de areias movediças e ficarão reféns do politicamente correcto. Na minha perspectiva, a frontalidade não pode ser confundida com a agressividade, mas deve ser entendida como opção pela verdade. Depois da conversa que tivemos, os dois colegas e eu, acredito que não haverá mais dúvidas sobre a personalidade de cada um de nós. Acredito também que todas as pessoas são livres de mudar de critérios, mas então que tenham a decência de respeitar quem coerentemente continua a defender os seus pontos de vista. A bem de uma profissão cada vez mais desmotivadora e de uma escola onde é cada vez mais difícil trabalhar…

 

Valeu-me o facto de ter acabado o dia a mortificar o corpinho numa boa sessão de ginásio. E o melhor de tudo é que alguém com quem tenho trocado olhares desde o início desta semana também andava por lá. Pode ser que daqui a algum tempo tenhamos assunto. Ou não... Por agora fico-me por aqui e mais não digo.
 


23
Mar 09

 

Este primeiro fim-de-semana de primavera ficou marcado pelo reaparecimento na minha vida de alguém de quem não tinha quaisquer notícias há mais de três anos. Através de um simples mail tive a inesperada surpresa de ver o A. entrar novamente na minha vida. Nunca falei aqui deste amigo tão especial, um amigo daqueles que se conhecem em momentos decisivos e que nos marcam para o resto da vida, mesmo que por força das circunstâncias os nossos caminhos sigam rumos diferentes e deixemos de nos contactar com a frequência que desejávamos. Foi o que aconteceu entre mim e o A.. Uma bela amizade que não resistiu à distância e ao tempo… até agora.

 

Intitulei este post/pensamento de "Não há coincidências...". Muita gente diz-me que sim. Que há coincidências. E para justificar a sua posição, acenam-me com factos e argumentos, à primeira vista irrefutáveis. Eu, porém, continuo a pensar que não. O que interessa é saber interpretar adequadamente os sinais que se escondem por detrás dos acontecimentos que são considerados por muitos como coincidências. Provavelmente só mais tarde, quando os acontecimentos já estiverem suficientemente maturados, é que se conseguem desvendar completamente as razões pelas quais um simples acontecimento é encarado como uma grande coincidência. Até lá, apenas podemos fazer conjecturas e arriscar explicações.


Contrariamente ao que penso, considero que o facto de o A. ter entrado de novo em contacto comigo neste momento é uma grande coincidência. No momento em que um grande amor sai da minha vida, aparece alguém por quem continuo a nutrir um carinho muito especial... Sendo uma pessoa de afectos, costumo ligar-me demasiadamente aos amigos. Por isso mesmo, quando se dão os afastamentos e se quebram as amizades, sofro a dobrar. Mas é assim que eu continuo a viver as minhas amizades, mesmo contra todos os ventos e marés. Voltando à razão de ser deste reaparecimento do A. na minha vida, tenho para mim que este facto, quando nada o fazia prever, quer mostrar-me alguma coisa, precisamente quando estou a tentar libertar-me das amarras que ainda me prendem ao M..

 

É no meio de um enorme turbilhão de sentimentos e emoções, quando ainda quero acalentar uma réstia de esperança de que algo possa mudar em relação ao M. e ao mesmo tempo tento convencer-me do contrário, que novos factos vêm juntar-se à história e pessoas que são importantes para mim entram de novo em cena. Começo a pensar que no palco em que decorre a representação da minha vida já não cabe mais ninguém. Estão lá todos os personagens. A representação entrou em cena. O sucesso está garantido. Pelo menos, para quem assiste à representação não será um tempo mal empregue... Já para mim estes acontecimentos, aparentemente sem qualquer significado especial, colocam-me sempre novas questões. Por isso mesmo, acho que a representação da minha vida está a ficar demasiado complexa…


Devo dizer que eu e o A. mantivemos ao longo de anos uma relação de grande amizade. Não uma "amizade colorida", mas uma grande amizade. De todas as pessoas com quem travei amizade ao longo da vida, foi talvez a pessoa com quem mais me identifiquei em todos os sentidos e com a qual mantive sempre uma relação de grande cumplicidade. Sem margem de erro, diria que nas minhas relações amorosas nunca existiu uma tal comunhão de sentimentos. Podem então perguntar-me porque é que as coisas nunca avançaram noutro sentido. Apesar de me questionar muitas vezes o porquê de isso não ter acontecido, arrisco agora uma explicação. Talvez porque a nossa amizade se sobrepôs a tudo o resto e foi considerada, ao menos tacitamente, como algo ainda mais importante do que qualquer relação de amor e que era preciso manter a todo o custo. Porque como disse atrás, o A. apareceu na minha vida num período deveras complicado, em que foi preciso tomar decisões difíceis, e a sua indefectível amizade foi determinante para mim nesses momentos. Mas isto são apenas divagações de alguém que gosta de discorrer pensamentos sobre pequenas coisas que lhe vão acontecendo no dia-a-dia…
 


16
Mar 09

 

Haverá melhor maneira de passar um fim-de-semana do que a gozar o dolce fare niente e a aproveitar o esplêndido sol que estes dias de final de inverno nos têm proporcionado? Claro que sim, dir-me-ão vocês. E eu acredito! Aliás, eu também penso que há uma e bem melhor. Passá-lo nos braços do meu Amor! Mas como tal não é possível, por agora resta-me passá-lo da melhor forma que sei e posso. Neste sentido, creio que existe sempre um grande nível de insatisfação entre aquilo que queremos e aquilo que podemos. E isso manifesta-se em qualquer idade. Senão vejamos. É a criança que faz uma birra monumental quando os pais não lhe compram o último jogo da PlayStation. É o adolescente que entra em depressão só porque o pai não autoriza tantas saídas à noite quantas a que ele desejava. É o adulto que fica à beira de um ataque de nervos só porque o vizinho do lado já tem o último modelo do carro dos seus sonhos e ele provavelmente nunca o conseguirá adquirir. É o casal que entra em crise conjugal porque não consegue alcançar um nível de satisfação sexual adequado. E assim por diante.

 

Aliás, penso que a insatisfação é um sentimento que nos acompanha ao longo de toda a vida. No entanto, encarado de forma positiva, pode ajudar-nos a concretizar projectos de vida e a alcançar metas. Não creio que a insatisfação em si seja algo negativo. O que poderá acontecer é que esse sentimento se prolongue por tempo indeterminado e se venha a tornar quase patológico. Por conseguinte, há que saber manter o ténue equilíbrio entre aquilo que se quer e o que se pode. Porque afinal existem coisas que nunca poderemos alcançar ou mudar. Algumas características físicas, por exemplo. Ainda assim, acredito que a este respeito a vida ajuda-nos sempre a lidar com a impossibilidade da mudança e a aceitar aquilo que não é passível de ser alterado. Mas voltando ao fim-de-semana, é sempre muito agradável passá-lo desta maneira descontraída… Assim dá gosto viver e esquecem-se por momentos as coisas desagradáveis do dia-a-dia e os muitos problemas que ainda povoam o meu pensamento. Pelo menos, nestes dias é possível dar boa vida a este computador, porque também ele merece descansar…

 


14
Mar 09

 

Algumas vezes, dou comigo a pensar se existe alguma característica que possa diferenciar o amor gay em relação ao amor heterossexual. E invariavelmente chego à conclusão que não. É um amor que nasce tão sem explicação quanto o amor entre um homem e uma mulher. É o coração que bate mais forte. É aquela vontade de estar junto de quem se ama. É aquele desejo de partilhar a vida toda. De facto, não pode existir coisa mais banal. Afinal, acontece todos os dias em qualquer parte do mundo com gente de todas as raças, cores e religiões.

 

A única diferença que poderá existir relaciona-se com a postura que cada um adopta quanto ao sentimento em si. E essas diferenças manifestam-se tanto no amor entre pessoas do mesmo sexo como entre heterossexuais. Como todas as pessoas, os homossexuais não são pessoas isoladas do mundo exterior e tudo o que se passa na sociedade envolvente repercute-se ao nível das suas vivências e dos seus afectos. Estamos na sociedade do descartável, onde a vida passa a correr e as pessoas, todas as pessoas, têm sede de amar e ser felizes, mas muitas vezes não sabem o que é o amor e tornam-se egoístas porque a sociedade assim as moldou. Neste sentido, somos o produto das nossas próprias vivências e, porque não dizê-lo, das vivências dos outros, que nos afectam em maior ou menor escala. Há anos conheci um rapaz, que logo no primeiro encontro já me perguntava se eu queria namorar com ele enquanto babava literalmente por qualquer um que se aproximasse de nós… Perante isto, penso que cada um deve parar para reflectir que tipo de amor deseja dar e receber.

 

Voltando ao amor que une duas pessoas do mesmo sexo, vejo-o cada vez mais como um amor especial, considerando que se desvia do propósito do amor orientado para a procriação, superando assim todos os determinismos biológicos que encaminham o ser humano para a união com o sexo oposto, visando o cumprimento da função reprodutora da espécie. E dadas as circunstâncias sociais que habitualmente o envolvem terá de ser ainda um amor mais forte do que o amor heterossexual pelo valor inestimável das inúmeras provas a que tantos casais homossexuais se submetem diariamente por estarem com alguém do mesmo sexo. Por conseguinte, parece-me inadmissível que alguém, seja ele quem for, venha pôr em causa o amor profundo e verdadeiro e todos os sentimentos de afecto, carinho, intimidade e partilha que eu, como homossexual, sou capaz de nutrir por alguém do mesmo sexo.

 

Costuma dizer-se que uma relação heterossexual não pressupõe normalmente o acto de afirmação identitária da sua sexualidade e que um heterossexual ama sem pensar que é heterossexual. Em contraponto, diz-se também que um homossexual, ao fazê-lo, muito dificilmente se abstrai da sua identidade sexual. Mas pergunto-me se esta ideia não é originada a priori pela conformidade com aquilo que civilizacionalmente se foi interiorizando como "normal". E, como dizia acima, nenhum homossexual está imune ao ambiente cultural que o rodeia. De facto, nenhum homossexual é uma ilha isolada… Por isso mesmo, é natural que seja difícil que, de um dia para o outro, possa abstrair-se de uma realidade que lhe foi incutida como a única "normal" e admissível. Até ao dia em que finalmente essa dita "normalidade" seja encarada doutra maneira, também pelos próprios homossexuais, e todos possamos viver plenamente a nossa sexualidade…

 


12
Mar 09

 

Ontem, acabei a tarde numa bela esplanada frente ao mar, a realizar que já cheira a primavera e que não tarda nada estamos de novo no verão. O sol ainda brilhava e as preocupações do dia-a-dia iam-se tornando etéreas perante o espectáculo de um mar que parecia convidar a um mergulho. Aliás, o mar sempre foi para mim uma espécie de confidente nas horas mais difíceis ou nos momentos mais felizes. Sou capaz de passar horas frente ao mar, simplesmente a olhar o horizonte e a reflectir na minha vida. Depois de tomar uma bebida fresca, tudo parecia ainda melhor, até que caí novamente no mundo real quando me voltei a confrontar com a notícia do dia: na Alemanha, um jovem de 17 anos, aparentemente normal e tranquilo, matou nove alunos e três professores na escola que tinha frequentado, sendo que um dos estudantes feridos acabou por falecer. Após o massacre, Tim Kretschmer pôs-se em fuga. Pelo caminho matou ainda mais três pessoas, até ser ele próprio abatido a tiro pela polícia. Ao todo 17 mortos. Naquele final de tarde, dei comigo a pensar que Tim podia ser um dos meus alunos. Que a escola de Winnenden podia ser a minha escola. Que os alunos massacrados podiam ser meus alunos. Que os professores assassinados podiam ser meus colegas. Que eu próprio podia estar entre os professores assassinados… Perante isto, nada mais me restou fazer senão olhar novamente o sol e o mar, cheirar a primavera e deixar que a natureza me alienasse mais uma vez…

 


11
Mar 09

 

Quase não me restam palavras para te dizer o que sinto neste momento. Mas ainda guardo algumas para te dizer o quanto sinto a tua ausência… O quanto a tua ausência afoga em mim as palavras que ainda tenho para te dizer... Dizias-me que palavras não passam de palavras. Mas acredita que estas palavras são sentidas. Acredita que mesmo poucas palavras são melhores do que o silêncio de duas pessoas que ficam sem mais nada para dizer uma à outra. E esse silêncio por incrível que pareça é um silêncio ensurdecedor. Já tive momentos desses quando ainda não tinhas entrado na minha vida. Mas tu chegaste sem hora marcada e trouxeste contigo um amor que eu julgava não merecer, brindaste-me com uma ternura que eu julgava não existir, fizeste-me sorrir como há muito eu não sorria, surpreendeste-me como jamais alguém conseguiu surpreender-me…


Não sei ao certo porque te foste embora da minha vida, nem quando resolveste partir para não mais voltar. Ou talvez para voltares quando finalmente caíres em ti e precisares de um carinho, de um abraço, ou simplesmente de alguém com quem possas desabafar, com quem possas contar, a quem possas confiar os teus dramas e segredos, sabendo que nunca serás julgado. Não sei ao certo quando te perdi. Se é que alguma vez te tive! Se é que alguma vez foste meu! Se é que alguma vez te entregaste totalmente a mim!

 

Queria dizer-te que há dias em que sinto um vazio enorme. É como se faltasse algo essencial à minha vida. É como se tu fosses o ar que preciso para continuar a viver… Ao mesmo tempo, sinto uma imensa surpresa. Eu que, na minha auto-suficiência, dizia não precisar de um amor assim. Mas tu apareceste na minha vida e tudo mudou. Vejo agora as minhas palavras negadas pelos meus próprios sentimentos… E então percebo como é fácil falar de ânimo leve, quando não estamos no meio da tempestade…

 

Queria dizer-te que há dias em que a solidão é um sentimento insuportável… É nestes dias que sinto mais saudades tuas, essa palavra que povoa o nosso imaginário colectivo e que de tão usada já perdeu quase toda a sua significância. Sim, saudades. Não sei se sabes do que estou a falar. Aquele sentimento que provoca um peso no estômago e faz doer até o músculo mais insignificante do teu corpo. Mas doer mesmo. Não sei se alguma vez sentiste essa dor. Mas acredita que dói muito... É nestes dias que a dor da tua ausência se faz sentir com mais força. E fico assim, triste, melancólico, como se apenas a tua presença ao meu lado me pudesse trazer algum conforto. Por isso, é nestes dias que em nome da tua ausência me remeto ao silêncio e fico por aqui, frente a um ecrã de computador, frio, distante, impessoal, a dizer-te umas palavras que para mim soam a tudo… mas que para ti soam a nada…

 


09
Mar 09

 

Fazendo a retrospectiva do fim-de-semana que passou, fico com a sensação que estou a deixar fugir a minha vida como areia por entre os dedos das mãos. Por diversos motivos, tenho adiado a conclusão do mestrado que estou a fazer. Nos últimos dois meses, a tese tem estado arrumada a um canto, à espera de dias melhores. De facto, depois da minha separação ainda não me tinha sentido com capacidade intelectual para voltar a debruçar-me sobre a dita. Mas este fim-de-semana consegui novamente pôr mãos à obra e aquilo que durante a semana tinha planeado fazer teve de ser adiado para outra ocasião. Quase não tive tempo de aproveitar os esplêndidos dias de sol deste fim de Inverno. No meio disto tudo, questiono-me sobre a utilidade de mais este grau académico. Mas sei que tenho de fazer um esforço para acabar o que comecei e não ver a minha vida eternamente adiada...

 

Do resto do mundo, nada de novo. Senão vejamos. A Igreja brasileira, com a bênção do Vaticano, anda ocupada em lançar excomunhões sobre meninas de 9 anos violadas pelos padrastos e obrigadas a abortar porque, segundo os médicos, corriam risco de vida. Nada de novo... Depois da morte do seu Presidente e do chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, a Guiné-Bissau continua a ser um país adiado, onde impera a "lei da catana" e onde a pobreza extrema convive paredes-meias com a corrupção e o narcotráfico. Nada de novo... Ontem foi o dia da mulher e embora não querendo ser desmancha-prazeres, defendo que a existência de um dia como este traz sempre uma marca sexista e discriminatória para as próprias mulheres. E pergunto-me: então se apenas o dia 8 de Março é o dia da mulher, quer dizer que os restantes 364 dias do ano são dias do homem? Nada de novo...

 

E neste jardim à beira-mar plantado também não se passou nada de novo. Que um histórico deputado do PS tenha dito numa entrevista que seria capaz de concorrer contra o seu próprio partido e ser acusado logo de seguida por um seu correligionário de "falta de carácter", não é nada de novo... Que o procurador-geral da República tenha dito que a procuradoria não funciona, não é nada de novo... Que um ilustre juiz venha reconhecer que há corrupção no futebol, não é nada de novo... Que o maior orgulho tecnológico do governo de Sócrates tenha tantos erros de português que até façam corar uma criança do 1.º ano do ensino básico, não é nada de novo... Agora que a líder da oposição tenha mudado de visual e faça lembrar algo parecido a um cruzamento entre a Margaret Thatcher e o Martini Man (esta fui roubá-la ao Eu é mais bolos... não resisti...), isso, sim, já é uma novidade digna de registo...

 

Aqui fica a fotografia que não me deixa mentir. E mais não digo...

 

 


04
Mar 09

 

Tu chegaste à minha vida num dia em que eu não te esperava. Chegaste e foste ocupando todos os espaços que havia em mim para ocupar até não restar espaço para mais nada nem mais ninguém. Chegaste, ocupaste todos os espaços, mas não me quiseste revelar o mais recôndito do teu ser. Dizias-me que não tinhas de o fazer. E talvez tivesses razão. Porque afinal duas pessoas são duas pessoas. E cada uma dessas pessoas precisa do seu espaço vital para poder respirar… Precisa tão desesperadamente desse espaço como os pulmões precisam de oxigénio para poderem continuar a funcionar. Infelizmente, muitas vezes não pensamos nisto desta maneira tão crua e tão directa. Queremos saber tudo acerca do outro e pensar que não existe espaço para a individualidade de cada um. Digo-o por mim próprio. Mas queria dizer-te também que numa relação existem duas pessoas que se escolheram mutuamente para partilhar uma vida e o que essa vida lhes trouxer de bom e de mau. E para isso é preciso arriscar dar um passo mais à frente...

 

Tu nunca quiseste dar esse passo. Dizias-me que não ias mudar, como se eu te tivesse pedido algum dia, uma única vez, que o fizesses. Mas sabes bem – e isto disse-te muitas vezes – que uma relação só resulta se as duas pessoas nela envolvidas aprenderem a fazer cedências. E acredito que isso não compromete em nada a nossa personalidade. Aprende com o barro que é moldado pelas mãos do escultor: ele não perde as suas propriedades quando é amassado, manuseado e transformado em obra de arte. Muito pelo contrário. Mantendo todas as propriedades intrínsecas que o definem naquilo que ele é, ele adquire contudo uma mais-valia em relação ao seu estado bruto anterior.

 

Tu também não comprometes a tua personalidade se deixares abrir uma brecha nessa muralha inexpugnável que foste erguendo em teu redor e em que gostas de te esconder aos olhos do mundo. Agora eu sei que é difícil a um amor, mesmo a um grande amor, vencer e transpor uma muralha como essa, mesmo que use todas as armas e reúna todas as forças para o conseguir. Porque dentro dessa muralha, bem lá no fundo, existe ainda uma cave onde escondes aquilo que não queres que ninguém saiba sobre ti. Como alguém escreveu: "Everybody has two sides. The side we show the world and the side we try to hide".

 

Eu também possuo algures uma cave onde escondo aquilo que não quero expor aos olhos do mundo. E é por isso que eu não percebo o sofrimento que sinto se afinal concluo que as coisas são mesmo assim. Mas arrisco uma explicação. Será por acreditar que contigo iria ser diferente. Que contigo poderia desnudar-me completamente, corpo e alma. Que contigo não teria nada a esconder porque eras o meu mundo e nesse mundo tudo nos era permitido… Até desvendar o segredo mais íntimo e o mistério mais bem guardado...

 


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